MENSAGEM AOS PARTICIPANTES DA AUDIÊNCIA PÚBLICA PROMOVIDA
PELO LEGISLATIVO DE CAMPO GRANDE
Em primeiro lugar, parabenizo pela iniciativa do Legislativo Municipal em promover esta audiência pública para discutir o papel da Guarda Municipal no contexto da segurança pública municipal.
Minha saudação especial ao nobre vereador Alex do PT, digníssimo presidente da Comissão Permanente de Segurança Pública;
Meus cumprimentos aos Guardas Municipais e todos os participantes deste evento.
Com relação a atuação das Guardas Municipais no Brasil, gostaria de destacar três pontos fundamentais para serem analisados com carinho pelos governantes, legisladores, operadores da segurança e pela população em geral.
1- A CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 88, que está em vigor.
A nossa Constituição, embora devesse ter a pretensão de ser duradoura, na verdade, nasceu para ser temporária.
Na verdade, por estarmos saindo de um regime de exceção, foi, no dizer de Almir Pazzianoto, então ministro de trabalho, a Constituição possível, que deveria ser revista para se adequar ao Brasil real. Isto tanto é verdade que estava previsto uma revisão da Constituição, o que não foi feito, e daí, as inúmeras Emendas Constitucionais que transformaram a nossa Carta Maior em uma colcha de retalhos, tudo para adaptar a nossa Constituição à real necessidade do país.
Na esfera da segurança pública, a recém promulgada Carta Cidadã não apresentou avanço compatível com a modernização da nossa sociedade e por consequência, ficou muito aquém das reais necessidades e demandas do clamor popular.
Esta observação deve ser feita para lembrar que não é a população que deve de adequar à Constituição, e sim, a Constituição que deve abrigar regulamentando as demandas do povo, norteando o relacionamento do cidadão com o Estado. Daí a PEC 534, visando emendar a Constituição para atender o clamor popular. A meu ver, desnecessária esta PEC, pois as Guardas já estão agasalhadas pelo Capítulo III do Título V da Constituição, ou seja: DA SEGURANÇA PÚBLICA.
Desta forma, é muito pobre a alegação do poder público e órgãos de segurança em afirmar que a Guardas exerce atividade inconstitucional. Até porque nunca se viu a população clamando pela criação de uma Guarda Municipal para cuidar de bens, serviços e instalações. Mas sim, clamando por mais SEGURANÇA.
Questiona-se pelo fato das Guardas estarem no parágrafo oitavo do artigo 144 da Constituição. Na verdade, ficou no parágrafo oitavo por dois motivos principais:
a) Pela pressão sofrida para que não se possibilitasse aos municípios criarem Guardas Municipais;
b) Pela faculdade do Município, em criar ou não, sua Guarda Municipal, lembrando que a Guarda é para o município que necessita e que pode, em função das possibilidades financeiras da municipalidade.
Todavia, o fato de estar no parágrafo oitavo não retira sua função dentro do capítulo “Segurança Pública”.
2- CUIDAR DE BENS, SERVIÇOS E INSTALAÇÕES, não a qualifica como GUARDA PATRIMONIAL.
O Segundo ponto a se destacar, é quanto á sua classificação, por alguns mal informados, de que a Guarda Municipal é uma Guarda Patrimonial.
Primeiramente porque não há no clamor popular manifestação para que se crie uma instituição para cuidar do patrimônio municipal, e sim, para melhorar a segurança do cidadão.
Por outro lado, cuidar de “bens públicos” não quer dizer cuidar apenas de prédios, de imóveis, etc. Bens públicos estão definidos pelo Código Civil, e se classificam em três categorias:
a) Bens públicos de livre acesso da população, ou seja “de uso comum do povo”: Ruas, Estradas, Praças, Avenidas, Rios, Praças, Praias, Parques, etc.
b) Bens públicos de acesso sob condições, ou seja “de uso especial”: Escolas, onde para frequentar tem que ser aluno; Hospitais: a certos espaços (não pode entrar na sala de cirurgia, por exemplo);
c) Bens públicos de acesso restrito: Ex: Almoxarifado da prefeitura, Oficinas, etc.
Portanto, quando um Guarda é escalado para trabalhar em uma praça, rua, hospital, escola, na verdade, ele não está sendo escalado para cuidar da rua, escola ou hospital, mas sim para garantir que o cidadão tenha acesso com segurança aos bens, serviços e instalações que o município disponibiliza para a sociedade. Um Guarda com um posto na praia não está cuidando da segurança ou do patrimônio “praia”, mas sim, cuidando para o todos os cidadãos tenham acesso com segurança ao bem público “praia”
Observemos que dentro deste quadro podemos visualizar claramente a Guarda Municipal no Capítulo Segurança Pública, atuando junto aos bens, serviços e instalações, pois todos os serviços são realizados dentro de um bem público (hospital, posto de saúde, ambulatório emergencial, etc), utilizando instalações para oferecimento de serviços (no caso serviço de saúde).
Portanto, Guarda Municipal não é patrimonial, mas sim, um agente na esfera da segurança pública municipal cuja missão é garantir o acesso da população aos bens, serviços e instalações em segurança.
Assim sendo, sempre que o Guarda se deparar com um flagrante, nos termos da lei, deve e pode agira sob pena da administração responder por omissão.
Eliminamos, desta forma a visão de que Guarda Municipal é patrimonial. Na verdade Guarda Municipal é uma agente aplicador da lei na esfera municipal.
3- O GUARDA MUNICIPAL É UM AGENTE DO ESTADO BRASILEIRO NA ESFERA MUNICIPAL:
A Guarda Municipal está inserida no Título V da Constituição Federal: DA DEFESA DO ESTADO E DAS INSTITUIÇÕES DEMOCRÁTICAS.
Isto significa que o Guarda Municipal é um AGENTE DO ESTADO BRASILEIRO NA ESFERA MUNICIPAL com função de atuar na SEGURANÇA PÚBLICA, garantindo que o cidadão tenha acesso e usufrua em segurança dos bens, serviços e instalações oferecidos pela municipalidade.
O que quer dizer “Defesa do Estado”?
O ESTADO para existir, necessita de três elementos essenciais: Território, Povo e Soberania. Faltando um desses três elementos não existe Estado (Poder Público).
O Território compreende o espaço aéreo, marítimo e terreno. Povo é o que da vínculo ao Estado. Soberania: poder do Estado de criar suas leis e impô-las sobre a população em seu território.
O Estado é um ente abstrato, pessoa jurídica. Portanto necessita da ação humana de pessoas que se comprometem em emprestar suas ações humanas para que o Estado(poder Público) possa criar e impor suas leis.
Neste diapasão, os Guardas Municipais são agentes do estado Brasileiro na esfera municipal cuja missão é impor a soberania do Estado no caso concreto, em outras palavras, fiscalizar, orientar e impor o cumprimento da lei. Cumprimento da lei que é a “vontade do Estado” ou seja, é o exercício da soberania do Estado na esfera municipal.
Conclusão: O Guarda Municipal, agente do Estado Brasileiro na esfera municipal, atuando na segurança pública, como agente aplicador da lei, tem a função de assegurar, aos cidadãos, o acesso, o uso e a frequência, em segurança, aos bens, serviços e instalações oferecidas pela municipalidade. Assim sendo, está legalmente legitimado para agir sempre que alguém esteja sendo vítima de alguma violências ou ação deletéria á sua vida, imagem, valores ou patrimônio. O Guarda Municipal tem o PODER-DEVER DE AGIR.
Observemos que o Guarda Municipal é o único agente municipal que está explicitamente incluso sob o Título V da Constituição: DA DEFESA DO ESTADO E DAS INSTITUIÇÕES DEMOCRÁTICAS.
QUANTO AO PODER DE POLÍCIA DA GUARDA MUNICIPAL.
O senso comum tem confundido “Poder de Polícia” com a atuação policial.
Já nem falo sobre “Poder da Polícia” porque isto é uma aberração. A Polícia, seja Federal, Estadual ou ferroviário, ou rodoviária, enfim, a polícia não tem poder. A Polícia tem função, ou seja tem competência para atuar em uma esfera de atividades. Poder é sempre do Estado.
Portanto, quem tem o Poder é o Estado. Os órgãos policiais são constituídos por seres humanos que emprestam suas ações humana para que o estado concretize sua soberania. Logo estes seres humanos recebem o nome de AGENTES DO ESTADO. Assim temos GAENTES DO ESTADO na esfera federal (polícia federal, por exemplo), na esfera estadual (polícias civis e militares, por exemplo) e na esfera municipal (guardas municipais, por exemplo).
Todos estes AGENTES DO ESTADO BRASILEIRO tem uma missão em comum: na sua esfera de competência, devem impor a soberania do Estado Brasileiro, ou seja, impor a lei.
Para impor a lei, não basta ser agente do estado brasileiro, há que se estar INVESTIDO de PODER DE POLÍCIA.
PODER DE POLÍCIA: instrumento DO ESTADO BRASILEIRO, vinculado á SOBERANIA DO ESTADO, instrumento este que o ESTADO(PODER PÚBLICO), investe em seus agentes para que estes, usando tal poder, possa CONTRARIAR INTERESSES INDIVIDUAIS OU COLETIVOS em benefício da sociedade e defesa do próprio Estado. Ou seja: quando há um som em alto volume, altas horas da madrugada perturbando o sossego público, o guarda municipal, usando o PODER DE POLÍCIA, que é um instrumento que o ESTADO(PODER PÚBLICO) investe em seus agentes, irá CONTRARIAR interesses em benefício da sociedade: este é o exercício do poder de polícia. Quando um policial prende alguém, ele está contrariando interesse individual em benefício da sociedade. É o poder de polícia que impõe ação coercitiva ao exercício da soberania do estado-poder público.
Portanto, o Guarda Municipal está investido de poder de polícia, ao contrário do que é difundido pela mídia, confundindo poder de polícia com atuação de polícia.
GUARDA MUNICIPAL ARMADA OU DESARMADA?
Esta é uma decisão política muito delicada, pois não se trata apenas de armar ou não a guarda. Estamos falando sobre dar ou não condições do profissional defender a própria vida quando em atividade defendendo a vida de terceiros;
Como esperar que um ser humano, pai de família, tenha uma atuação destemida, sem poder defender a própria vida?
O índice de letalidade pelo uso de armas pelas Guardas Municipais do Brasil é quase zero!
Lógico que a Guarda deve ser devidamente treinada, mas para isso, há requisitos legais a serem cumpridos, conforme o Estatuto do desarmamento:
a) A Guarda ou a Prefeitura deve ter uma OUVIDORIA, para ouvir a população sobre a atuação dos guardas municipais;
b) A Guarda deve ter uma Corregedoria independente, para analisar as ocorrências visando o aprimoramento do profissional e, até a exclusão do mal profissional;
c) Treinamento teórico anual;
d) Treinamento prático de tiro defensivo anual;
e) Avaliação psicológica por profissional credenciado pela Policia Federal, de todos os portadores de armas a cada dois anos.
Já houve ocorrências onde vereadores eram contra atuação da Guarda Municipal armada, porém, ele ao ser vítima de sequestro, se viu socorrido por guarda com arma particular. Esse vereador passou a defender uma guarda armada e mais atuante.
Ninguém nasce sabendo ou nasce policial ou guarda.
Por outro lado, a casa ideal para instrumentalizar e dar condições dignas de trabalho para os seres humanos Guardas Municipais é exatamente esta casa: o Legislativo Municipal. O Legislativo tem tripla função: Sentir a necessidade da população por segurança; Legislar de forma a dar condições de trabalho para a Guarda e, promover o controle externo da Guarda, fiscalizando a atuação da Guarda.
O Brasil está entrando em um período de grandes eventos internacionais em nosso país. Todo tipo de turista estarão em nossas terras. A segurança de nossa população e dos turistas será o nosso maior desafio. Sabemos que as forças estaduais, por mais boa vontade que tenham, será insuficiente para atender as demandas. É pois, um questão de interesse público, treinar e equipar as Guardas Municipais para ser um reforço à atuação das polícias estaduais juntamente com a polícia federal.
Encerro minha mensagem desejando sucesso para todos os participantes deste evento, lembrando que muito mais importante que ser puxado pela história é sermos locomotivas da história.
Esta é uma excelente oportunidade para Campo Grande ser uma das locomotivas da história da formatação de um novo paradigma de segurança pública para o país.
Abraço fraternal a todos.
São Paulo, 01 de Outubro de 2012.
Dr Osmar Ventris
Advogado formado pela USP;
Secretário Geral do Instituto de Pesquisa, Ensino e Consultoria em Segurança Pública Municipal- IPECS
Pesquisador, Professor, Palestrante e Consultor em Segurança Pública Municipal;
Autor do livro; “Guarda Municipal: Poder de Polícia e Competência”