Guardas Municipais: Síntese
de um reconhecimento anunciado.
Osmar
Ventris[1]
“Uma Doutrina de Segurança e Risco”
“É o município
célula básica onde o cidadão vive e trabalha” ... “Assim, à Guarda Municipal deve
caber a tarefa dentro da estrutura do Poder Público, Município, Estado e União,
de exercer prioritariamente a ação ostensiva preventiva na garantia da
segurança do cidadão” ... “desse modo, a ação preventiva ostensiva
da Guarda Municipal em todos os quadrantes da cidade servirá de posto avançado,
órgão básico de informações e de ligação entre o cidadão e os demais Poderes do
Estado. Se o município é a sentinela avançada e o primeiro escalão responsável
pelos serviços essenciais do cidadão, transporte, saúde, educação, caberia a Guarda
Municipal exercer junto a esses serviços e nos seus órgãos encarregados, a ação
de presença preventiva e, mesmo conforme o caso, dotada de ação repressiva, eis
que a ação delituosa se faz presente em todos os tipos de situação.”
Erasmo
Dias – Deputado Estadual – 1993
(apud MORAES, Benedito A A, 1995, pg 42 – A
Guarda Municipal e a Segurança Pública)
Introdução
A discussão sobre o papel das Guardas
Municipais no Brasil tem sido tema de intenso debate desde a promulgação da
Constituição Federal de 1988. No entanto, foi a partir de 2005, participando
ativamente de movimentos com guardas municipais, que comecei a escrever e
defender de forma incisiva a tese de que as Guardas Municipais exercem
atividade policial, sendo, portanto, uma Polícia Municipal. Essa visão foi
consolidada em 2007, com o lançamento da primeira edição do meu
livro-ensaio "Guarda Municipal: Poder de Polícia e
Competência", no qual argumentei que o Poder de Polícia é um atributo
do Estado e que todos os agentes públicos, como representantes do Estado, estão
investidos desse poder.
Na obra, esclareci que somente os
agentes públicos que exercem atividade policial estão autorizados a portar
armas, algemas e bastões (tonfas) para fazer valer a lei, em benefício da
sociedade e na defesa do próprio Estado. Hoje, neste ensaio, retomo as reflexões
que apresentei há 18 anos, analisando a evolução do papel das Guardas
Municipais, sua fundamentação legal e filosófica, e sua missão na segurança
pública. Reafirmo a direção que sempre preconizei: a Guarda Municipal é a
Polícia Municipal, pois sempre exerceu atividade policial, zelando pela
segurança e ordem no município.
Desenvolvimento
1. O Poder de Polícia e a Atividade
Policial das Guardas Municipais
O conceito de Poder de Polícia é central
para entender a atuação das Guardas Municipais. Em minha obra de 2007, defendi
que o Poder de Polícia é um poder do Estado, exercido por seus agentes para
garantir a ordem e a segurança pública. Esse poder não se restringe às polícias
tradicionais (Federal, Civil e Militar), mas se estende a todos os agentes
públicos que atuam na defesa do Estado e das instituições democráticas. Nesse
sentido, as Guardas Municipais, como agentes do Estado na esfera municipal, estão
investidas desse poder e, portanto, exercem atividade policial.
A Constituição Federal de 1988, no
Título V - "Da Defesa do Estado e das Instituições Democráticas", e
no Capítulo III - "Da Segurança Pública", estabelece que a segurança
pública é dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, e é exercida
para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do
patrimônio. Em minha obra, argumentei que as Guardas Municipais estão incluídas
nesse contexto, garantindo aos cidadãos o acesso e uso seguro e ordenado dos
bens, serviços e instalações oferecidos pelo poder público.
Enfatizei dois pontos fundamentais:
1.
O
Guarda Municipal está inserido no Título V da CF/88: "Da Defesa do Estado
e das Instituições Democráticas". Portanto, o Guarda Municipal é um agente
do Estado Brasileiro na esfera municipal, com a missão de defender o Estado e
as instituições democráticas no âmbito municipal.
2.
O
Guarda Municipal está inserido no Capítulo III do Título V - "Da Segurança
Pública". Logo, também atua na segurança pública, ou seja, na segurança do
cidadão na esfera da competência municipal, exercendo atividade policial
municipal.
2. A Evolução Legal das Guardas
Municipais
2.1 - Constituição Federal de 1988
O artigo 144 da Constituição Federal possibilita
a criação das guardas
municipais incluindo-as no Capítulo Segurança Pública do Título
Defesa do Estado e das Instituições Democráticas, fornecendo a base legal para a existência e
atuação das guardas municipais, ampliando seu campo de atuação em função das
demandas municipais por segurança pública.
2.2 - Estatuto Geral das Guardas
Municipais
A Lei 13.022/2014, conhecida como o
Estatuto Geral das Guardas Municipais, foi um marco importante na
regulamentação das atividades dessas instituições. Essa lei estabeleceu
diretrizes claras para a atuação das Guardas Municipais, reconhecendo seu papel
na segurança pública e definindo suas competências. Entre outras coisas, a lei
permitiu que as Guardas Municipais atuassem de forma preventiva e repressiva,
em colaboração com as demais forças de segurança, para garantir a ordem pública
e a segurança dos cidadãos.
2.3 – Constitucionalidade da atuação das
Guardas Municipais
A decisão do Supremo Tribunal Federal
(STF) em 2020, que confirmou a constitucionalidade da atuação das Guardas
Municipais como força de segurança pública, foi um passo decisivo nesse
processo. O STF reconheceu que as Guardas Municipais exercem atividade policial
e que sua atuação é essencial para a segurança pública, especialmente no âmbito
municipal. Essa decisão corrobora as teses que defendi desde 2005, consolidando
o papel das Guardas Municipais como uma força policial municipal.
2.4 - A Decisão do STF de 20 de
Fevereiro de 2025
Em 20 de fevereiro de 2025, o Supremo Tribunal Federal
(STF) proferiu uma decisão histórica que ampliou as atribuições das Guardas
Municipais, permitindo que atuem em policiamento urbano, desde que não
sobreponham as atividades das polícias Militar e Civil. Segundo o STF, "as
guardas municipais não têm poder de investigar, mas podem fazer policiamento
ostensivo e comunitário e agir diante de condutas lesivas a pessoas, bens e
serviços, inclusive realizar prisões em flagrante. Sua atuação fica limitada às
instalações municipais, em cooperação com os demais órgãos de segurança pública
e sob a fiscalização do Ministério Público".
O relator do processo, ministro Luiz Fux, foi favorável à
ampliação dos poderes da Guarda Municipal, posição acompanhada pelos ministros
Nunes Marques, Alexandre de Moraes, Dias Toffoli, Flávio Dino e André Mendonça.
Essa decisão reforça o entendimento de que as Guardas Municipais são uma força
de segurança pública essencial, atuando de forma complementar às polícias
tradicionais.
2.5 - A Proposta de Mudança do Nome da
Guarda Municipal para Polícia Municipal
Em decorrência da decisão do STF, o
Prefeito de São Paulo propôs mudar o nome da Guarda Municipal para Polícia
Municipal. Essa proposta reflete o reconhecimento das atribuições que as
Guardas Municipais já exerciam há anos, apesar de contrariar interesses
meramente corporativos. A mudança de nome não é apenas simbólica, mas
representa a consolidação do papel das Guardas Municipais como uma força
policial municipal, com competências claras e reconhecidas legalmente.
3. A Filosofia de Atuação e a Missão das
Guardas Municipais
A missão das Guardas Municipais vai além da simples
proteção de bens e instalações públicas. Como destaquei em 2007, a Guarda
Municipal tem a responsabilidade de garantir a ordem pública, permitindo que os
cidadãos possam acessar e usufruir dos bens e serviços públicos de forma segura
e ordenada. Isso inclui a prevenção de crimes, a mediação de conflitos e a
intervenção em situações de desordem ou risco à segurança dos cidadãos.
A filosofia de atuação das Guardas Municipais deve ser
pautada pela defesa do interesse público e pela proteção dos direitos
fundamentais dos cidadãos. Diferentemente dos seguranças privados, que atuam na
defesa de interesses privados, os Guardas Municipais são agentes do Estado e,
portanto, têm como missão impor a Soberania do Estado e proteger a sociedade
como um todo. Essa distinção é crucial para entender o papel das Guardas
Municipais na segurança pública e sua importância para a manutenção da ordem e da
paz social.
4 - Conclusão
A evolução do papel das Guardas Municipais no Brasil, desde
as minhas primeiras reflexões até as recentes decisões do STF, demonstra que
essas instituições são, de fato, uma força policial municipal essencial para a
segurança pública. A fundamentação legal e filosófica de sua atuação, baseada
no Poder de Polícia e na defesa do interesse público, confirma que as Guardas
Municipais não são uma mera premonição, mas uma constatação da necessidade de
uma força de segurança pública no âmbito municipal.
A decisão do STF de 20 de fevereiro de 2025 e a proposta de
mudança do nome da Guarda Municipal para Polícia Municipal por algumas
prefeituras são passos importantes nesse processo, consolidando o
reconhecimento das atribuições que as Guardas Municipais já exerciam há anos,
apesar de contrariar interesses meramente corporativos. Esses avanços reforçam
a importância das Guardas Municipais como agentes da segurança pública,
cumprindo sua missão de proteger a sociedade e garantir a ordem no âmbito
municipal.
A decisão do STF de 20 de fevereiro de 2025 e a proposta de
mudança do nome da Guarda Municipal para Polícia Municipal por
algumas prefeituras são
passos no sentido do
reconhecimento das atribuições que as Guardas Municipais, com
os parcos recursos municipais, vem exercendo com destemor em nosso país há
décadas em prol da qualidade de vida de nossa população.
A Marcha ainda
não terminou. Ainda temos um caminho a percorrer, e sei que há vários grupos
unidos perseverando para regulamentação cabal tendo em vista o clamor popular
por segurança com qualidade por agentes municipais, que conhecem e se
identificam com a cultura local.
5 - Referências
Bibliográficas
BRASIL. Constituição da República
Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 10 out. 2023.
BRASIL. Lei nº 13.022, de 8 de agosto de
2014. Dispõe sobre o Estatuto Geral das Guardas Municipais. Disponível
em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2014/lei/l13022.htm. Acesso em: 10 out. 2023.
MORAES,
Benedito A. A. Guarda Municipal e Segurança Pública. Piracicaba-SP: Gráfica
Degaspari, 1995.
VENTRIS, Osmar. Guarda Municipal: Poder
de Polícia &
Competência. 1ª ed. São Paulo: Editora Canal 6, 2007.
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF). Decisão
sobre a constitucionalidade da atuação das Guardas Municipais. 2020. Disponível
em: http://www.stf.jus.br. Acesso em: 10 out. 2023.
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF). Decisão
de 20 de fevereiro de 2025 sobre o policiamento urbano pelas Guardas
Municipais. Disponível em: http://www.stf.jus.br. Acesso em: 10 out. 2023.
Osmar Ventris[2]:
Especialista
(stritu sensu) em
Segurança Pública e autor do livro-ensaio "Guarda Municipal: Poder de
Polícia e Competência".